“La inseguridad de la “seguridad alimentaria”, descolonizar el “desarrollo” como meta universal para construir ‘sostenibilidad alimentaria’ en América Latina”
José de Souza Silva/Pesquisador da Embrapa
Falar em Desenvolvimento Sustentável é falar no paradigma do mundo atual. A palavra desenvolvimento, que antes era sinônimo de progresso e crescimento, hoje passa a ter outro enfoque, o da sustentabilidade.
Entretanto, é importante ressaltar que há anos tomamos como base para o desenvolvimento somente os aspectos econômicos o que acarretou extrema competitividade e desgaste dos recursos naturais pelo atual modelo para a agricultura. E nesse sentido o mercado tomou um rumo extremamente individualista e transformou a racionalidade das pessoas e como ressalta Bourdieu (2008): “los vínculos reducidos a su dimensión puramente ‘económica’ son concebidos como vínculos de guerra, que sólo pueden entablarse entre extraños. El lugar por excelencia de la guerra económica es el mercado...”.
Por isso é importante falar de desenvolvimento e questionar o modelo vigente cheio de contradições mas contradições que são só aparentes. Se não vejamos o que diz José de Souza Silva, pesquisador da Embrapa, “A humanidade foi recentemente surpreendida por uma crise alimentar num mundo onde prevalece a abundância. Estudos recentes confirmam que o alimento produzido globalmente é o dobro da necessidade mundial. Não foi a escassez de alimentos a causa da suposta crise alimentar, mas as contradições do sistema agrícola e alimentar que remete a uma ordem institucional corporativa que organiza o sistema alimentar para o lucro de empresas transnacionais que controlam o sistema e não para alimentar a população mundial”.
Conforme pesquisa da FAO, hoje existem cerca de 800 milhões de pessoas no mundo em situação de extrema pobreza. A população vive em meio a uma insegurança alimentar. A FAO estima que o número de pessoas subnutridas no mundo caiu de 1,02 bilhões em 2009 para 925 milhões em 2010. A nova estimativa indica uma reversão na tendência de aumento da fome verificada nos últimos 15 anos. No entanto, não podemos nos esquecer que, em 1990-1992, a população subnutrida no mundo era de 843 milhões, ou seja, 82 milhões a menos que o estimado para 2010.
Mas, se a produção de alimentos dobrou no mundo, então porque 800 milhões de pessoas continuam passando fome? Na América Latina é particularmente preocupante a evolução da subnutrição nos países centro-americanos. Nesta sub-região, o número de pessoas subnutridas, longe de diminuir, continua aumentando.
Entre 8 e 12% da população da América Latina é indígena. Desses 80% são discriminados e vivem abaixo da linha da pobreza, são os povos mais vulneráveis da região.
A América Latina tem características geográficas e características climáticas, que favorecem a diversidade de produtos. E isso, obviamente, significaria uma alimentação muito rica e saudável. Entretanto, desde a colonização novos costumes e hábitos foram introduzidos entre os povos indígenas. O trigo foi trazido pelos espanhóis há 500 anos e substituiu, lamentavelmente, muitos dos produtos energéticos que os povos originários conheciam.
No equador, na cidade de Chimboraza, 94% da população é indígena. Nesta região é onde mais tem se concentrado a exclusão, a pobreza, a desnutrição e a fome. Falamos de uma média de desnutrição de 26%, mas, em relação às comunidades rurais e comunidades indígenas, encontramos dados que, em alguns casos, chegam a 40%. As crianças começam a se envolver no sistema de trabalho a partir dos seis(6) ou sete(7) anos para constituir um apoio econômico para as famílias.
Não bastasse isso, em 3 anos a base alimentar de milhões de pessoas na América Latina e Caribe ficou 60% mais cara. Aproximadamente 70% da humanidade se alimenta de milho, arroz e trigo. De 2006 a agosto de 2008, esses cereais subiram 97%.
Segundo a FAO (Fundos das Nações Unidas para a Agricultura), a América Latina e Caribe têm sido a região do planeta mais afetada no aumento de preços dos alimentos depois da África.
Finalmente é importante observar que neste cenário prevalece a busca frenética pela eficiência produtiva da agricultura reduzida a uma máquina de produzir alimentos, fibras e energia. Este mundo condicionado por decisões científico-técnicas é o domínio de engenheiros e outros especialistas indiferentes ao humano, ao social, ao cultural, ao ecológico e ao ético, tendo como causa a sua formação condicionada pelo paradigma clássico de inovação da ciência moderna. Estes especialistas entendem que seu mandato profissional se resume a “produzir mais alimentos” sem preocupação com a forma de produzir nem com o destino dos alimentos e menos ainda com as questões de sua distribuição e acesso. Seu imaginário técnico está condicionado pelo significado quantitativo do conceito de “segurança alimentar”, sem compromisso com a história nem como o contexto, constitutivos da natureza e dinâmica do ciclo de sustentabilidade alimentar em diferentes sociedades. A fome é um problema social que resulta da forma de organização social da produção e distribuição de alimentos.
SIDNEI DE PAULA CORRAL
Secretário de Relações Internacionais para as Américas
Fonte:
BOURDIEU, Pierre. La Fabricación Del Habitus Econômico. Revista Latinoamericana de ciências sociales: La vida Social de La economia: Critica en desarrollo. Parana, Argentina, 2008, 2ed.
Engenheiro Agrônomo, mestre em Sociologia da Agricultura e Ph.D. em Sociologia da Ciência e la Tecnologia. Foi o criador e Gerente da Secretaria de Gestão e Estrategia (SGE) da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA). Atualmente é Pesquisador da EMBRAPA para as relações ciência-tecnologia-sociedade-inovação (CTSI) e Consultor do Projecto PALMA em Cuba.
FAO (2009a). El Estado de la Inseguridad Alimentaria en el Mundo 2009. Rome: FAO.